No dia 01 de novembro, quarta-feira, terminou a 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, pouco antes tinha acontecido outro evento central no calendário audiovisual da América Latina. Também presenciamos nesta última quarta (08/11), o 31º MixBrasil, um dos maiores eventos culturais LGBT+ do mundo, que também apresenta uma vasta seleção cinematográfica brasileira e mundial que promove a cultura e diversidade.
Apesar desses eventos ocuparem um grande holofote e despertarem maior interesse um cenário denso sobre o assunto bem mais amplo que será aprofundado com a ajuda de Guilherme Whitaker (Guiwhi), idealizador e produtor da Mostra do Filme Livre (MFL), já tendo recebido edições no Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e também no formato online. Agora o destino será um nova edição em Brasília, a partir deste próximo 22/11.
O segmento cultural do Brasil gerou R$230 milhões, este valor correspondeu a 3,1% a soma de todas as riquezas do país, isto é, o Produto Interno Bruto (PIB). Em 2022, foram registrados cerca de 7,3 milhões de empregos formais e informais neste setor.
Entre essas práticas existe uma atividade regular que é disseminada em diversas cidades brasileiras, a de Festivais de Cinema, a última estimativa organizada pelo Guia Kinoforum registrou navegando pelo portal da plataforma FilmFreeway (plataforma referencial para realizadores inscreverem filmes em festivais), pelo menos 197 eventos cadastrados por lá, o número é ainda maior (e adiantando a fala de nosso convidado existe uma estimativa para um futuro levantamento exato desses dados) .
O número elevado, não esconde a importância e o peso da prática dos festivais de cinema. há uma gama de cineastas e aspirantes que procuram exibir seus filmes e também existe público que busca espaço para poder assistir essas obras, porém, existem pormenores e diversos fatores das esferas políticas e sociais; para um olhar mais aprofundado elencamos uma entrevista com GuiWhi conduzida pelo editor do site e publicada de forma parcial aqui originalmente.
Marcio Weber:
Você tem uma longa trajetória no audiovisual brasileiro. Nesse sentido, qual foi o filme brasileiro que mais te impactou/influenciou na sua formação? Também gostaria de saber qual foi sua maior loucura como um trabalhador de audiovisual? Além dessas perguntas, se tivesse que destacar um feito hoje, qual seria? E hoje quais são suas atuações relativas ao cinema além da Mostra do Filme Livre?
Guilherme Whitaker:
Meu primeiro contato com o cinema foi como amante, sem maiores pretensões, quando em 1986 morei no Chile e gravei em VHS 2h de um dia no colégio. Este material acabou virando um curta em 2003, quando já tinha empresa produtora, o curta 1986 pode ser visto aqui
Meu primeiro contato profissional com o cinema foi logo depois, em 1989/90, quando fui o primeiro gerente da vídeolocadora do Estação Botafogo, o original. Ali, tive contato direto com fitas VHS de filmes de todos os tempos e de todo o mundo, além de acesso às salas de cinema do Estação, quando assisti a dezenas de filmes que ali passavam. Nesta época também participei do Cineclube Limite, que acontecia mensalmente na FACHA (Faculdade Integrada Hélio Alonso), também Botafogo.
O filme que mais me marcou na vida, visto neste período em 35mm, foi "Vá e veja", do russo Elem Klimov, e de cinema Brasileiro, sem contar os curtas que chegavam em VHS, o longa ´Nós que aqui estamos por vós esperamos", nesta mesma época, foi bem marcante. Sem contar os clássicos como "Limite", "Terra em transe" e "Bandido da luz vermelha", obrigatórios e fundamentais para se entender quem somos audiovisualmente
A maior loucura que fiz pelo cinema foi, quando morei nos EUA, em 1995/96, ter filmado em 16mm algumas cenas numa estrada de ferro, colocando fogo numa mala, quando quase acabei preso por tentativa de incêndio. Era imigrante ilegal e foi uma loucura total, mas deu tudo certo. Tais imagens ainda não viraram filme mas quem sabe um dia viram, a ver.
Hoje, busco condições de fazer um novo curta, meu último é de 2015, chamado "Instante Karma"e pode ser visto aqui. Enquanto isso não acontece, sigo na produção de eventos como a MFL e a mostra Lumiar Audiovisual, sigo ajudando nas sessões do Cineclube Lumiar (Nova Friburgo) e na produção do site Curta o Curta, que criei em 2000 e segue ativo e 100% independente, sem jamais ter tido um centavo de patrocínio algum, hoje com mais de 3.800 !!!!! notícias, desde 2000
Marcio Weber: A MFL é um grande celeiro do cinema independente, dando espaço para diferentes realizadores, sensibilidades e realidades de trajetória. Em mais de vinte anos de histórias, muitos filmes passaram no festival. Em termos estéticos, temáticos e regionais, o que pôde se perceber ao longo dos anos no sentido de caminhos para o cinema brasileiro.
Guilherme Whitaker: A média de filmes que recebemos a cada ano é de mil títulos, de todo o Brasil, todos os gêneros, formatos, épocas e temas. Somos, aliás, o primeiro evento, desde 2002, a receber tamanha gama de filmes, sem restrições, ainda na época em que havia distinção entre cinema e vídeo, que ajudamos a enterrar por sinal, hoje é tudo audiovisual.
Algo que temos notado nos últimos anos, pré-pandemia e agora que voltamos, é a quantidade de filmes realizados de forma caseira, entre amigos e/ou familiares, esse sempre foi o foco da MFL e seguimos recebendo centenas de filmes com tais perfis. Também alguns temas tem sido recorrentes ano a ano, como filmes que tratam de questões de transição de gênero (sexual) , questões afrodiaspóricas, feministas, juventudes e de reforma agrária, não por acaso temas em grande debate no Brasil de hoje.
Marcio Weber: Hoje qual é a principal atribuição de um festival de cinema para a formação de público, novos espectadores? A MFL pôde perceber a formação de novos autores/espectadores nas ações promovidas pelo evento? Qual a sua avaliação da predisposição dos indivíduos brasileiros em prestigiar o cinema nacional e diferentes linguagens de cinema.
Guilherme Whitaker: Creio que a principal função de um festival segue sendo a de apresentar e refletir junto a seu público filmes que tenham a ver com a proposta do evento, que é bem variada. No Brasil hoje é possível que existam cerca de +250 festivais, no momento inclusive o Fórum dos Festivais esta realizando uma pesquisa para atualizar tais números, pois muitos eventos não sobreviveram aos últimos anos de desmonte cultural.
Existem eventos de todos os tipos, desde os maiores e mais ricos, que normalmente dão espaço a filmes da indústria e comercio audiovisual, normal, visto que é um setor que emprega milhões de pessoas e o Brasil produz excelentes filmes de mercado, é justo que tenham eventos focados nestes nichos.
Porém, nem só de verbas milionárias e glamour se faz a cinematografia de um país, até pelo contrário. Muito da graça e da força audiovisual está no que é feito por amor ao cinema, por livre expressão, por pessoas comuns que, hoje mais do que nunca, conseguem fazer seus filmes. Um país gigante como o nosso não sabe num tipo de cinema apenas, até porque o Brasil também é imensamente criativo, não só no audiovisual mas em todas as artes, o Brasil é um celeiro infindável de artistas e isso é maravilhoso. Enquanto certos países fazem guerras, nós fazemos arte.
Então chegamos num dilema ancestral e complexo: historicamente sempre se investiu muitas vezes mais na produção de conteúdos do que em sua difusão. Para a indústria, que detém os meios tanto de fazer quando do mostrar, é ótimo, pois segue dominando tudo e deixando cada vez menos espaço e voz a todos que não estão na mesma praia, a saber, justamente a produção e principalmente a difusão independentes, feitas mais por amor, sim, amor, à arte, do que para lucrar.
Por que? Porque arte em geral e cinema em particular não se resume ao que o "status quo" faz e difunde. Por isso somos resistência cultural, contra o que o mercado quer dizer que é o certo, o bom, o importante. Podem até ser, mas também, não apenas. Tudo isso se complica muito com a revolução digital, seja no fazer, seja no mostrar filmes. É tudo ótimo e terrível ao mesmo tempo. Hoje qualquer pessoa, de fato, se quiser, consegue se expressar por meio do audiovisual, sozinha e/ou com amigos, realizando obras por vezes muito mais interessantes e/ou relevantes do que outros produtos realizados com grandes verbas.
Porém tais conteúdos encontram dificuldades para serem vistos e daí, reconhecidos. Nosso papel é equilibrar um pouco estas questões, pois o cinema não é apenas entretenimento e investimentos que precisam lucrar, cinema é vida e, como tal, pode revirar o mundo e as mentes, essência da pulsão artística desde sempre.
Assim, filmes feitos sem verbas terão muito mais dificuldades para serem vistos do que os filmes caros e já feitos num esquema combinado de produção e difusão, seja ele presencial ou não. É assim no mundo todo e aqui mais ainda, pois poucos detém os meios de difusão de massa, praticamente o grupo Globo, seus afiliados e o resto. Aos filmes independentes restam os festivais e cineclubes, todos combalidos desde o golpe de 2016, quando o país acelerou sua ida ao caos, que hoje tentamos reverter.
A internet ajuda na difusão, claro, mas daí chegamos no excesso de conteúdo oferecido a cada dia, como diferenciar o seu conteúdo dos demais. Eventos presenciais servem, enfim e também, para destacar, dentre tantos filmes no cenário, os mais interessantes e/ou relevantes, aquele evento. E isso, com certezas, ajuda o filme e seus/as realizadores/as a se destacarem neste amplo cenário, ao ser selecionado, exibido , debatido e/ou premiado em algum evento, o filme e sua equipe incrementam seus currículos e portfólios, o que tende a ajudá-los em suas próximas realizações.
Uma tendência que temos notado, de forma geral, é que, tirando os eventos industriais (que a grande mídia promove), as mostras e festivais de cunho mais cultural do que comercial tem enfrentado dificuldades para levar um grande público às suas sessões. Este ano a MFL teve um público de 1070 pessoas em 10 dias, média inferior da pré-pandemia, quando tínhamos a média de 5.000 pessoas durante 30 dias de evento. Foi nosso primeiro evento presencial depois de quatro anos e cremos que tais números tendem a melhorar nos próximos anos.
No caso do RJ é um pouco mais complexo pois a cidade, infelizmente, atravessa um longo período de decadência social e alguns locais onde a MFL rolou este ano ficavam em locais de difícil acesso por conta, principalmente, da violência em voga no centro da cidade. E calhamos de acontecer exatamente no período em que estavam rolando as inscrições de projetos na Lei Paulo Gustavo na cidade e no estado, quando todos da área audiovisual estavam focados em realizar suas inscrições, que eram burocráticas e de prazo curto, sendo que este público é muito o público da MFL, chance que todos tem de ver o que tem-se feito Brasil adentro de forma autoral e independente. O que nos salvou em termos de público foi a mostra online.
Marcio Weber - Quais são as principais adversidades para se montar um festival. Como se manter atrativo com tantas barreiras e limitações?
O pouco investimento público e privado na difusão. São poucos editais e de valores insuficientes para dar minimamente vazão ao que o mercado cultural precisaria para, de fato, levar mais conteúdos à população. Como dito, historicamente se prefere investir no FAZER filmes do que no MOSTRAR, daí temos uma imensa quantidade de filmes feitos que depois disputam os (relativamente) poucos espaços de difusão. Enquanto essa questão não for tratada da forma que precisa, com pensamento de longo prazo, para reverter esta situação, via políticas de estado com "Ancines" (Agência Nacional do Cinema) e "Mincs" (Ministério da Cultura) da vida envolvidos, tudo seguirá na mesma, ou seja, vai piorando a cada ano, visto que o que estagna, não evolui e daí piora.
Dinheiro nunca foi nem é o problema, o que falta mesmo é vontade e disposição política para resolver de fato estes problemas não pra este ano apenas mas de forma definitiva, resumindo, falta política de estado, como houve entre 2004 e 2012, os melhores anos da Cultura no Brasil, mas que não tiveram prosseguimento.
Marcio Weber: Existe uma tentativa simbólica da MFL na descentralização da cultural, promovendo edições em outras cidades, itinerâncias e a adesão ao ambiente online. Quais são as principais questões?
Guilherme Whitaker: Sim, tentativa houve e há, este ano. Buscamos parcerias com pessoas de outros estados para que usassem a LPG (Lei Paulo Gustavo) em parceria conosco a fim de levar parte da MFL para suas cidades. Recebemos 25 inscrições de todo o Brasil e até o momento conseguimos realizar algumas inscrições, que aguardam o resultado. Porém muitos editais da LPG em pequenas e médias cidades não abriram editais para difusão, preferindo a produção, aquela mesma ideia já criticada aqui.
Durante a pandemia realizamos duas edições da MFL online. Este ano, após a mostra presencial no RJ, realizamos uma edição online também, com premiação em dinheiro, e tivemos um excelente resultado de + 7.000 visualizações, apenas nas páginas dos 33 curtas que estavam em competição.
Imagino que é importante realizar parte do evento de forma online para permitir que pessoas de todo o Brasil, e não apenas quem mora na cidade do RJ, possam ver ao menos alguns dos filmes do evento. Mas nada vai substituir uma exibição numa sala de cinema com tela grande e som bacana, quando a imersão na obra é total. A ideia é , então buscar o equilíbrio entre ambas ações, presencial e online, sendo a primeira a principal e a secunda secundária, como um complemento. Assim, é possível incrementar o público do evento e permitir que ele e seus filmes cheguem a mais gente, o que sem dúvidas tem valor.
Marcio Weber: Quais expectativas da vindoura edição em Brasília?
Guilherme Whitaker: Para a MFL em Brasília, este ano, acreditamos que podemos superar o público carioca, pois o evento se concentra num espaço apenas e, a despeito do CCBB em Brasília não ter fácil acesso de ônibus, principalmente aos finais de semana o público frequenta o espaço, onde acontecem diversas atividades, e onde contamos com a maior presença do público nas sessões. Também estamos construindo uma Cabine Livre que ficará no vão do prédio e que deve chamar a atenção do público, contamos com isso para muito incrementar o público da MFL DF, visto que na cabine livre passamos videoartes em looping, permitindo um grande acesso diário.
Marcio Weber: É uma pergunta um tanto sensacionalista e excludente, mas se tivesse de citar algum filme (ou mais de um, caso se sinta mais à vontade), que o interessado em ampliar o repertório do cinema brasileiro?
Guilherme Whitaker: De fato é complexo resumir em apenas alguns filmes um cenário tão amplo, ate porque também são muitos os "tipos" de filmes, do infantil ao erótico, do narrativo ao mais conceitual e/ou experimental ou popular, e para cada um destes existe um potencial público interessado. A MFL busca justamente ser esse incrível e gigante painel de nosso cinema possível. Este ano foram +180 no RJ, alguns excelentes, outros nem tanto mas importantes de exibir seja por conta do tema tratado e/ou da forma como foi feito, então são muito fatores que levam um filme a ser selecionado e mesmo premiado na |MFL. O que posso sugerir são os filmes premiados este ano. São curtas, médias e longas que muito acreditamos, até porque premiamos, e que indicamos com toda a certeza, são eles:
PAULA GAITÁN, pelo conjunto da obra; DUO STRANSGOSCOPE, pelo conjunto da obra; o curta NENHUMA FANTASIA, de Gregorio Gananian e Negro Leo; o curta CINEMA PARA OS MORTOS, de Bruno Moreno e Renato Sircilli; o média CAIXA PRETA, de Saskia e Bernando Oliveira; o média A ESTRATÉGIA DA FOME, de Walter Fernandes Jr; o longa SINFONIA DO FIM DO MUNDO, de Thiago Brito e Isabella Raposo. A MFL2023 RJ também concedeu MENÇÃO HONROSA para: o longa BRASIL 1977, de Felipe Kusnitzki; pelo conjunto da obra de REBECCA MOURE; o longa AS LINHAS DA MINHA MÃO, de João Dumans e o curta de escola PRESENTE , de Pedro Coelho Xavier
Marcio Weber: Existem muitos desafios e questões a serem superadas. O que melhorou e o que continua muito ruim na sua experiência como alguém que difunde a cultura audiovisual por tanto tempo?
Guilherme Whitaker: Os desafios sempre foram muitos e complexos, hoje seguem sendo, talvez mais complexos porque muitas questões de antes seguem presente e se somam às novas, com o advento e crescimento exponencial da internet na vida de todos, o que, como sabemos, é ótimo por muitos aspectos, e ruim por tantos outros. Isso em todas as áreas, não apenas na cultura e/ou no audiovisual. O maior desafio, para quem faz filmes e para quem quer exibi-los, é conseguir cativar as pessoas a preferirem sair de casa para ver curtas-metragens e/ou médias e/ou longas de gente desconhecida.
Mas sempre foi difícil, agora apenas ficou mais difícil, a depender de onde se está e de onde acontecem as sessões. O Brasil é gigante e não se pode achar que os problemas são iguais, não são, a depender se a localidade fica em uma capital ou numa cidade menor, se está na região central e/ou mais afastada.
O ideal é que a difusão de nosso audiovisual chegue Brasil adentro, com a proliferação de cineclubes por exemplo, mas infelizmente, mesmo usando a LPG, como o problema é antigo e grande, não é suficiente, ainda mais quando não há continuidade, ou seja, até se consegue realizar alguns meses de sessões mas sem garantia de que nos próximos anos tais ações seguirão rolando.
Como diz o cineasta e pesquisador Marcelo Ikeda, o ideal seria que todo pedreiro lesse um poema por dia, visse um curta por semana, essa deveria ser a motivação de todos os envolvidos na proliferação da arte no Brasil, que ela de fato chegasse a todos.
FOLDER 2023 da Mostra do Filme Livre.
Cinema possível em ação! +20 anos!
Cinema possível em ação! +20 anos!
Sem dúvidas a história do cinema independente brasileiro dos últimos 20 anos passa pela MFL, seu maior exibidor cultural, com média de 200 filmes por ano, passando milhares de filmes para milhares de pessoas de todas as regiões do país, via CCBBs, Cineclubes Livres e demais parcerias. A MFL também ajudou a enterrar de vez a briga entre cinema x vídeo, por algo melhor e maior, o audiovisual. Tanto fazendo o formato, a duração eou o gênero do filme, mais importando o tema e a forma como ele foi audiovisualmente pensado e feito, exibido e daí sabido. Por fim, sobreviveu à pandemia e ao pandemônio e viu, literalmente, algo de fato novo adentrar ao circuito das artes em geral, a popularização da inteligência artificial, e a sua inicial relação com o fazer e o mostrar, em celulares e/ou telões.
No Brasil das últimas décadas o gargalo entre a produção de filmes e a sua difusão seguiu tão grande e diversificado quanto a qualidade de nosso audiovisual. Aqui criticamos esta diferença do que se investe para se fazer filmes em detrimento ao gasto para exibir tais conteúdos ao povo, que muitas vezes pagou pelas produções através de leis de incentivo e Ancines da vida. Há algum tempo que o atual modelo já se mostra sem futuro, porém se impõe, também pelo capital e mídia que eles mesmos são em retro-alimentação. É vital ampliar o horizonte do possível ao apostar em ações, públicas e privadas, que valorizem a cultura como meio de transformação de mundo e não apenas um fim monetário, é cultural, é social, é econômico e coletivo! Se a situação dos cinemas de rua e da difusão cultural já estava difícil pós DVD, com a internet a situação foi e segue sendo mais complexa. Assim, perde-se tudo que se modificaria pra melhor dentro e ao redor de um espaço cultural, de um cine-teatro ou de um cineclube regular num bairro afastado ou nem. Toda a humanidade triunfa onde o sublime habita, onde arte e cultura se somam e se aplicam, na utopia do viver sem medo de ser feliz.
Fundamental e urgente, então, que se equilibrem o FAZER e o MOSTRAR, o produzir e o exibir filmes, para além dos meios virtuais, valorizando e não matando, as exibições presenciais, num tiro no pé de todos os envolvidos. Nosso audiovisual precisa ser mais visto e não apenas por quem já o conhece eou o curte, mas por todos, como lembra Ikeda, "... missão de que todo pedreiro lesse um poema por dia, visse um curta por dia, não apenas a galera do audiovisual... " Aqui estamos na luta por mais e melhores políticas públicas e privadas em todos os níveis, ações que ajudem uma real cadeia produtiva do audiovisual que vá além da produção de conteúdos, investindo na preservação de nosso passado em filmes que vão se perder se não forem digitalizados, no incentivo à critica, à formação e na valorização de todos que trabalham no fazer e no mostrar audiovisual, seja este industrial, comercial ou caseiro. O histórico circuito nacional de mostras e festivais em consonância com o circuito nacional de cineclubes, quando apoiados, já fizeram milhares de ações culturais, formais e informais, Brasil adentro. Que tal reativar tais circuitos, para desespero dos fachos e nossa plena alegria?
Enquanto isso não for encarado como política de estado, que pode dar resultados a longo prazo e não apenas momentaneamente, pouca coisa vai de fato mudar. Como dito em meu editorial da MFL 2023, que copio abaixo, " Toda a humanidade triunfa onde o sublime habita, onde arte e cultura se somam e se aplicam, na utopia do viver sem medo de ser feliz."
Comments